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Encontro

Tocantinópolis faz história ao integrar comunidades indígena Apinajé e universitária

Por Mariane Pisani e Daniel dos Santos | Revisão: Paulo Aires | Publicado: Terça, 05 de Novembro de 2019, 11h32 | Última atualização em Quarta, 06 de Novembro de 2019, 12h35

No último dia 30 de outubro, a partir de uma parceria entre a UFT e a Escola Indígena Tekator, foi realizado no Câmpus de Tocantinópolis o I Encontro das Culturas Indígenas da UFT. Com a temática “A Luta e a Permanência na Universidade Pública”, o evento promoveu intensas trocas de saberes entre a comunidade Indígena e a comunidade Universitária.

No Câmpus de Tocantinópolis existem, atualmente, um total de 33 estudantes autodeclarados indígenas regularmente matriculados nos quatro cursos oferecidos: Pedagogia, Ciências Sociais, Educação do Campo e Educação Física. Esses discentes são provenientes de diversas etnias como, por exemplo: Krikati, Guajajara, Xerente e Apinajé. Vale dizer que os Apinajé estão presentes na UFT de Tocantinópolis desde a implantação da Universidade.

Os Apinajés em Tocantinópolis

As Terras Indígenas Apinajé foram demarcadas no ano de 1985, o que faz com que a cidade de Tocantinópolis compartilhe um longo, embora nem sempre amistoso, processo histórico de convivência com esta etnia, como explica a antropóloga e uma das organizadoras do evento, Mariane Pisani: “É sabido que os indígenas no Brasil, especialmente nas últimas administrações do Governo Federal, vêm sendo constantemente espoliados em seus direitos legais, bem como desvalorizados em suas diferenças culturais. Os Apinajé, a sua maneira, sentem os nefastos desdobramentos da necropolítica adotada como regime de governo nos últimos anos”.

Por isso, o I Encontro das Culturas Indígenas da UFT foi um evento que pode ser considerado um marco histórico para a UFT e também para a cidade de Tocantinópolis. Uma vez que jogou luz à presença indígena na cidade, assim como à necessidade básica de acesso e da permanência no sistema de Educação Superior. O evento é histórico também porque partiu da iniciativa dos próprios estudantes indígenas do Câmpus a partir da necessidade de se “fazer presente”, de se “fazer ver” e de se “fazer resistência” em um cenário político e social que pratica atitudes brutais às populações indígenas brasileiras, segundo Mariane.

Três momentos do evento

Manhã
Na parte da manhã, houve a apresentação do Projeto “Grernhõxwỳnh Nywjê – Fortalecimento da Cantoria entre os Jovens nos Rituais Apinajé”, coordenado por Júlio Kamêr Ribeiro Apinajé, professor na Escola Indígena Tekator. Houve ainda pinturas corporais, Corrida de Tora e uma série de cantorias Apinajé entoadas pelo cantor Juliano Nhinô.

Marcaram presença nesta primeira atividade alunos indígenas e não indígenas, bem como professores e técnico-administrativos do Câmpus de Tocantinópolis. Também participaram deste momento alguns professores e estudantes da Educação Básica da Escola Professor José Carneiro de Brito, professores do IFTO e estudantes e professores do Câmpus de Araguaína.

As toras utilizadas na Corrida de Tora foram doadas ao Câmpus de Tocantinópolis como marca simbólica da presença, da cultura e da resistência indígena na UFT. Delas serão feitas, futuramente, um memorial.

Tarde
No período da tarde, tivemos a Roda de Conversa “Diversidades e Culturas Indígenas”, mediada pela professora Luana Mara Pereira. Durante a Roda de Conversa foram elencadas pelos estudantes indígenas da Escola Indígena Tekator, pelos estudantes indígenas da UFT e pela comunidade Indígena Apinajé uma série de medidas que visam à facilitação do ingresso e da permanência dos estudantes indígenas na Universidade Federal do Tocantins.

Foram levantados os seguintes pontos:
a) É necessário que a UFT comprometa-se em ofertar cursos de Extensão voltados para as comunidades Indígenas existentes no Câmpus de Tocantinópolis. Sobretudo cursos de Informática Básica e cursos de Língua Portuguesa que visem o aperfeiçoamento da escrita e da compreensão de textos acadêmicos;
b) É crucial que sejam disponibilizados ônibus para a comunidade indígena Apinajé nos dias em que são realizadas as provas do Vestibular UFT e do ENEM. Essa medida visa consolidar a presença de estudantes das Escolas Indígenas Apinajé da região durante essas avaliações e, consequentemente, aumentar a presença de estudantes indígenas na UFT de Tocantinópolis;
c) É imprescindível que haja o fortalecimento do Programa Institucional de Monitoria Indígena (PIM), para que se evite a evasão dos estudantes indígenas da UFT;
d) É importante que haja maior divulgação, bem como ampla oferta e implementação de bolsas permanência para estudantes indígenas da UFT;
e) Levantou-se, por fim, a ideia para a criação e implementação de um espaço físico onde as estudantes indígenas possam deixar seus filhos nos momentos em que estiverem em sala de aula.

Noite
A última atividade do dia foi a mesa-redonda “Educação Escolar Indígena: do Ensino Básico ao Ensino Superior”. A abertura desta mesa foi feita com músicas Apinajé entoadas pelo cantor Alexandre “Zé Cabelo” Apinajé.

Sob a mediação do professor Rafael Caetano Nascimento, foram convidados a compor a mesa: Nataniel da Vera-Cruz Gonçalves Araújo (Diretor do Câmpus de Tocantinópolis), Emilio Dias (Diretor de Unidade Escolar da Escola Indígena Tekator), Júlio Kamêr Ribeiro Apinajé (Coordenador do projeto Grernhõxwỳnh Nywjê e professor na Escola Indígena Tekator), Davi Wanhmẽ Apinajé (Diretor de Unidade Escolar da Escola Indígena Mãtyk), Cassiano Sotero Apinajé (Coordenador Pedagógico da Escola Indígena Mãtyk), Rosilene Fernandes da Costa Apinajé (estudante no curso de Pedagogia e integrante da Comissão Organizadora do Evento) e Sidilleia Idiolorrinã Lima Karajá (estudante no curso de Educação Física).

Esses sete palestrantes contaram, para um auditório lotado, um pouco sobre suas trajetórias escolares, da Educação Básica à Educação Superior. Todos enfatizaram as dificuldades e lutas vividas durante todo período de escolarização bem como apontaram os momentos de vitória e de resistência para permanecer em um espaço nem sempre pensado ou mesmo voltado para as particularidades indígenas.

Avaliação do evento

Ao longo das atividades do dia 30 de outubro, tivemos a presença de mais de 100 pessoas, entre estudantes, professores, técnico-administrativos da UFT, indígenas da etnia Apinajé e pessoas da comunidade local. Na avaliação da organização é inegável que a presença indígena na Universidade pública alavanca profundas reflexões sobre os processos educacionais, bem como sobre os processos de entrada e permanência dos estudantes indígenas nos quatro cursos existentes no Câmpus. Toda Comissão Organizadora espera que este evento seja ponto inicial para reflexões que se desdobrem em políticas públicas educacionais voltadas aos estudantes indígenas não apenas da UFT, mas de todas as Universidades públicas de nosso país.

A estudante indígena, Rosilene Fernandes da Costa Apinajé, do curso de Pedagogia, foi uma das idealizadora do I Encontro das Culturas Indígenas na UFT. Ela explica que a ideia para o evento surgiu de um diálogo na Disciplina de Educação e Arte, ministrada pelo professor Rafael Caetano Nascimento. O professor propôs aos acadêmicos indígenas do povo Apinajé que apresentassem uma atividade cultural durante a disciplina. Rosilene e os  colegas Elizangela Dias e Wesley Pepkoi, da turma de 2018: "Somos oriundos da Escola Indígena Tekator e achamos que seria importante demonstrar a cultura Apinajé”.

Para este evento se concretizar se fez necessário toda uma mobilização da UFT de Tocantinópolis, Escola Tekator e comunidades das aldeias Apinajé. “Os participantes da Escola Indigena Tekator e algumas comunidades das aldeias Apinajé tiveram a oportunidade poder expressar a sua cantoria e atividade cultural como dança ao redor da aldeia, cantoria com maracá e corrida de tora com buriti. Todas essas são atividades cotidianas da nossa etnia”, explicou Rosilene. 

Parcerias

A realização do I Encontro das Culturas Indígenas da UFT fora construída em parcerias com a Diretoria Regional de Educação de Tocantinópolis, Funai, Pimenta Festas & Eventos e Prefeitura Municipal de Tocantinópolis, que contribuiu com a alimentação (café da manhã, almoço e lanche da tarde) para todos os indígenas participantes do evento.

 

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