Dia Internacional dos Povos Indígenas: uma reflexão sobre respeito, direitos e diversidade
Celebrado em 09 de agosto, a data é um marco na luta dos povos indígenas pelo respeito à suas culturas e pela garantia de seus direitos
Instituído durante a Assembleia Geral das Nações Unidas (ONU) pela resolução 49/214, em 23 de dezembro de 1994, o Dia Internacional dos Povos Indígenas, que é celebrado desde 1995, é resultado da luta e atuação de lideranças indígenas de diversos países na busca por seus direitos e pela afirmação da identidade de seus povos. A data escolhida para dar visibilidade às reivindicações dos povos indígenas de todo o mundo, foi 09 de agosto, dia que faz referência à primeira reunião do Grupo de Trabalho da ONU sobre Populações Indígenas, em 1982.
Para além de uma data “comemorativa”, o Dia Internacional dos Povos Indígenas objetiva destacar a necessidade da valorização das diferentes culturas e etnias indígenas existentes ao redor do mundo, e reforçar a luta para que as populações indígenas tenham seus direitos garantidos e não sejam afastados ou excluídos da cidadania. Outro ponto ao qual a data visa dar visibilidade é a importância do combate ao preconceito e às diversas formas de violência às quais os indígenas ainda são submetidos na atualidade.
De acordo com os dados disponibilizados pela ONU, existem cerca de 370 a 500 milhões de indígenas no mundo, distribuídos em cinco mil culturas diferentes. Isso significa dizer que aproximadamente 5% da população mundial é indígena. No entanto, mesmo com o reconhecimento formal de seus direitos, ainda existem significativas lacunas entre o que está expresso em documentos, como a Declaração sobre os Direitos dos Povos Indígenas, e a realidade vivenciada por esta população.
Segundo o relatório Estado dos Povos Indígenas no Mundo, divulgado pela ONU em 2021, entre os principais desafios enfrentados pelos indígenas na atualidade, está a dificuldade de fazer valer o direito a suas terras, a degradação ambiental e as mudanças climáticas. Já no Brasil, além dessas questões, os povos indígenas ainda lidam com o preconceito, obstáculos no acesso à educação, saúde e o pouco espaço no debate público de suas reivindicações, fatos que reforçam a importância das reflexões promovidas pelo dia 09 de agosto.
O papel da universidade na luta pela causa indígena e os obstáculos a serem rompidos na UFT
Na luta pela garantia dos direitos da população indígena, a educação é fundamental. Neste sentido, as universidades, enquanto instituições de ensino que têm como base a pesquisa, o ensino e a extensão, possuem um papel estratégico na difusão de conhecimentos que contribuam para dar visibilidade às reivindicações indígenas. É o que destaca a pró-reitora de Extensão, Cultura e Assuntos Comunitários da UFT, Maria Santana Milhomem. Para a pró-reitora, o dia 09 de agosto tem uma importância significativa, principalmente para a população indígena brasileira: “O Dia Internacional dos Povos Indígenas é um dia marcante, principalmente para o Brasil, porque não é apenas um dia , mas ele se transforma num dia simbólico para todos os dias, porque todo dia é um dia de luta constante para os povos tradicionais viverem aqui no Brasil e acessarem uma boa educação, a uma boa saúde e os quesitos básicos para a vida de um ser humano”.
A pró-reitora ressalta também os avanços da UFT em relação ao atendimento dos estudantes indígenas, reiterando as conquistas da Universidade, que foi a primeira federal do país a adotar o sistema de cotas para estudantes indígenas. Mas também reconhece que a UFT tem um árduo trabalho pela frente para melhorar a qualidade de vida dos indígenas na Universidade: “Para a Universidade Federal do Tocantins, nós temos algumas conquistas para serem comemoradas, uma delas é a política de cotas da UFT. Nós temos uma política consolidada de cotas de entrada, mas precisamos ainda avançar na política de permanência, isso é um fato. Nossa política de permanência ainda é bastante frágil na Universidade. Os estudantes indígenas do estado do Tocantins ainda têm muita dificuldade de estarem aqui na instituição”.
Ela ressalta ainda a importância da política de cotas a nível nacional e comenta sobre as ações que estão sendo desenvolvidas na UFT em relação aos estudantes indígenas: "Uma outra conquista que nós temos e que é possível comemorarmos são as políticas de cotas nacional, que também destina vagas para os estudantes indígenas nas universidades. Mas a gente sabe que as dificuldades, quando o aluno acessa a universidade ainda é muito grande, principalmente em relação a dificuldade da universidade compreender a questão cultural das comunidades tradicionais. Por isso estamos num processo de aprovação, no Consepe, da política de ações afirmativas. Foi uma política discutida nos cursos, nos câmpus, com algumas comunidades, mas a gente sabe que não basta ter a política, é preciso implementá-la. Então, nós temos ainda muitos desafios com relação à educação bilíngue, a educação intercultural dentro da Universidade”.
Os estudantes indígenas também reconhecem o progresso da UFT, mas enfatizam que mudanças são necessárias. É o que destaca Vanicleisson Karajá, do Povo Karajá Xambioá, que cursa o último semestre de Ciências Contábeis, no Câmpus da UFT em Palmas. Para ele, que é uma das lideranças da União dos Estudantes Universitários Indígenas do Tocantins (UNEIT) e também atua no Grupo de Trabalho Indígena e Quilombola (GTIQ), a data é um momento de lembrar que a Universidade não pode se acomodar com as conquistas já alcançadas: “ O dia 09 de agosto é um dia de luta para nós povos indígenas. E trazendo isso para dentro da universidade, nós temos avançado. Abriu-se o sistema de cotas, a UFT é pioneira no sistema de cotas, temos o GTQI, que é um ponto de apoio, no entanto, a gente vem "engatinhando” na questão da permanência, que é a dificuldade do indígena conseguir permanecer na universidade. Um dos desafios é que o indígena bilíngue tem dificuldade com a questão do próprio português, da ortografia, da gramática e isso seria papel do acompanhamento pedagógico, que é o que a gente vem colocando sempre, a importância de se trabalhar e construir algo ouvindo, nós povos indígenas”.
As palavras de Vanda Sibakadi Gomes Da Silva Xerente, que cursa o décimo período do curso de Serviço Social no Câmpus da UFT em Miracema, caminham no mesmo sentido. Para ela, a Universidade precisa ter um olhar mais amplo para com os estudantes indígenas, principalmente no que diz respeito à permanência indígena na Universidade: "Aqui em Miracema, por exemplo, nós não temos casa do estudante, a maioria dos estudantes indígenas não conseguem nenhuma bolsa, principalmente pela dificuldade de lidar com a documentação e nem todos os pais têm condições de mantê-los aqui na cidade, pagando aluguel. A gente espera que a UFT tenha uma visão ampla, em relação aos indígenas, porque a gente já conseguiu algumas coisas, a gente tem o GTIQ, e as bolsas permanências - quando as cotas foram criadas a gente ainda não tinha. Foi a luta, foi uma luta muito grande dos estudantes e da UFT e assim conseguimos abrir essa porta para os indígenas. Espero que continue”.
A professora Solange Nascimento, que é coordenadora de Ações Afirmativas da UFT, também destaca a importância do o Dia Internacional dos Povos Indígenas para a luta indígena: " A data é de grande relevância, em especial para a luta dos povos indígenas frente às políticas que nós temos hoje a nível nacional e que diz respeito a própria Constituição Federal e aos direitos já institucionalizados no país via acordos internacionais, dos quais o Brasil é signatário, de políticas de proteção e atenção aos povos indígenas e aos seus territórios. Então o dia 09 de agosto é um marco no que se refere a fazer uma reflexão sobre a importância da luta dos povos indígenas pelos seus territórios, pelos seus direitos constitucionais". A professora ressalta ainda as conquistas dos povos indígenas no que diz respeito a educação e reforça a necessidade de ações voltadas para a permanência dos indígenas na universidade: " Nesse contexto de direitos constitucionais, nós temos também a educação, porque o direito à educação básica, o direito ao ensino superior, o direito às cotas de acesso à universidade são conquistas dos povos indígenas. E mais do que isso, e pensar também que o dia 09 é um dia para a gente pensar também na importância das vagas epistemológicas e das políticas de permanência dos indígenas dentro da universidade. Porque não basta acessar, é importante que haja políticas para a permanência desses alunos e alunas no espaço acadêmico e que eles se vejam nos currículos e se vejam nas epistemologias que são adotadas no espaço acadêmico".
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